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Sobre NBA e afins

Não é de hoje que a torcida do Jazz é questionada por atitudes reprováveis

Chris Nicoll-USA TODAY Sports

Eu realmente gosto quando a torcida de um time da NBA foge da mesmice e mostra alguma identidade apaixonada. Via de regra, o clima das arquibancadas é de algo meio pasteurizado, mais parecido com uma plateia de um espetáculo morno que só sabe gritar ‘DEFENSE! DEFENSE!” independente dos times que correm em quadra do que com uma torcida de fato que reage ao jogo, que move o time e que consegue atrapalhar o rival. A multidão do Utah Jazz é uma destas exceções. Há um consenso na liga do quão difícil é ir até Salt Lake City e enfrentar o time da casa na Vivant Arena. Nestes playoffs, inclusive, os narradores chegaram a reclamar que não conseguiam escutar a própria voz dada a gritaria durante o jogo. Não chega a reproduzir o clima das torcidas dos times de basquete da Grécia, Turquia e Leste Europeu, mas é o suficiente para se diferenciar do que rola no resto da NBA.

Infelizmente, essa empolgação frequentemente descamba para um caminho perigoso, como se a paixão pelo time e a necessidade de importunar o rival justificasse manifestações ofensivas e de mau gosto. Foi esta a reclamação de Russell Westbrook depois da partida em que o Jazz eliminou o Oklahoma City Thunder. Ele disse que foi insultado com xingamentos racistas e por isso reagiu agressivamente contra dois torcedores na saída da quadra. Por mais que há quem diga que Westbrook é um cara esquentado e que iria lidar mal com qualquer provocação que fosse feita no seu ouvido naquele momento, o histórico da torcida do Jazz nos faz crer que o desabafo de Russell era sincero. Há um padrão cretino em algumas manifestações em Utah que não é de hoje.

O mais emblemático de todos é o caso com Derek Fisher, em 2007. Um torcedor foi flagrado com uma mão no olho direito tentando tirar a atenção do armador enquanto batia um lance livre. Ele fazia uma referência ao câncer no olho que a filha de Fisher vinha tratando desde o ano anterior. Além de ser uma provocação desumana, era de uma ingratidão sem tamanho, já que no ano anterior, quando a menina foi diagnosticada com a doença, Fisher jogava pelo Jazz e chegou ao ponto de, durante os playoffs, acompanhar uma consulta da criança pela manhã em Nova York, atravessar os EUA de avião, chegar a tempo para entrar em quadra no terceiro quarto de uma partida e ainda acertar o arremesso de três pontos que levou o jogo para prorrogação. Para aquele torcedor do Jazz, isso não importava: se Fisher estava agora com outra camisa, a do Lakers, valia tudo para fazer da vida dele um inferno durante aqueles 48 minutos de jogo.

E há outros relatos de atitudes de caráter duvidoso vindo de algumas pessoas da arquibancada da arena. Um famoso é o de Stephen Jackson. Quando ele ainda jogava pelo Golden State Warriors disse que estava feliz de voltar a jogar em casa, mesmo perdendo de 2 a 0, pois em Oakland ele não ouviria “xingamentos racistas e pessoas o mandando para a cadeia” a todo momento. Vale lembrar que Jackson já tinha saído na mão com um torcedor do Detroit Pistons e tem alguma bagagem para saber discernir quando uma provocação é corriqueira e quando não é. Outro é de JR Smith, que há dois anos disse em uma entrevista para a GQ que em Utah as pessoas não param de chamar os jogadores rivais de ‘nigga’.

Para tentar evitar que qualquer episódio desagradável se repita, a direção do Utah Jazz espalhou avisos aos seus torcedores alertando que nenhum comportamento inapropriado seria tolerado durante os jogos, sob pena de expulsão da arena e cancelamento do plano do torcedor para os próximos jogos.

Não acho certo rotular que a torcida do Jazz é racista e nem muito coerente dizer que isso acontece porque o povo em Utah é de tal jeito ou de tal religião – uma explicação comum para estes casos. Um grupo de torcedores não pensa de maneira uniforme e qualquer pessoa, independente da sua cultura ou crença, sabe que é inaceitável atacar alguém pela cor de pele ou caçoar da doença de uma criança. Mas é fato também que a repetição destes episódios depõe contra a massa.

Se não fosse um comportamento preocupante e de certa forma recorrente, a direção do time não teria se preocupado em orientar seus torcedores qual a forma correta de agir na arena – o aviso acima não é comum nas outras quadras. Também não viraria um escarcéu as vezes em que um torcedor provocasse um jogador rival por um motivo banal, nada condenável, como aconteceu quando um cara zoou James Harden por ficar tentando cavar faltas e o jogador reagiu dando um tapa no seu celular.

Mas é uma fama que a torcida do time terá que lidar até que todos estes casos condenáveis se resumam a um passado bem distante.

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