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Sobre NBA e afins

O pior de tudo é que esse vexame do Memphis Grizzlies pode ser em vão

(Nelson Chenault-USA TODAY Sports)

O Memphis Grizzlies é o retrato mais real do ‘tank’ – estratégia polêmica de alguns times que escolhem perder o máximo de partidas possíveis para ter as melhores chances de conseguir uma boa escolha de draft no ano seguinte. Depois que Mike Conley, armador do time, se machucou, o time teve apenas 11 vitórias e 47 derrotas. Do final de janeiro para cá, o negócio ficou mais explícito: 22 derrotas e apenas uma vitória – um acidente de percurso contra o confuso Denver Nuggets.

Se parecia que as 19 derrotas seguidas dos últimos meses era a coisa mais constrangedora que a gente poderia ver deste time (uma das 20 piores sequências em 70 anos de NBA), o jogo de ontem contra o Charlotte Hornets provou que um time ruim e dedicado em perder sempre consegue passar uma vergonha maior: o Memphis perdeu por uma diferença de 61 pontos para uma equipe que não briga por mais nada nessa reta final de temporada. Os Hornets fizeram 140 pontos e os Grizzlies, 79.

O último colocado da NBA, que já tinha um time recheado de desconhecidos e atletas vindos da G-League, liga de desenvolvimento da NBA que reúne caras que não conseguiram seu espaço na nata do basquete, ainda resolveu poupar Marc Gasol, estrela do time, e outra meia dúzia de jogadores da rotação contra o Charlotte. Daí deu no que deu: a sexta pior derrota da história da liga e a maior diferença de pontos dos últimos 20 anos.

Completo e jogando sério o Memphis não é um time tão ruim. É uma equipe de meio de tabela, com alguma chance de brigar pelos playoffs. Fazia tempo que não se via um time com alguma qualidade se esforçar tanto para ir mal. Os últimos que fizeram parecido já eram bem ruins por natureza e não tinham a escolha de tentar ir muito melhor.

Guardadas as devidas proporções, o Memphis de hoje tem algo do San Antonio Spurs de 1997, que perdeu David Robinson por lesão, tinha um resto de elenco envelhecido, e se esforçou para perder e ir bem no draft seguinte. Com aquele time deu certo. A franquia selecionou Tim Duncan com a primeira escolha, recuperou Robinson e consolidou uma das maiores supremacias do esporte.

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Mas os Grizzlies não são os Spurs. Por mais que tenha uma cultura vencedora recente, o time não está no mesmo patamar – o San Antonio tinha sido um dos melhores times da NBA anos antes -, não tem Gregg Popovich no banco de reservas e Marc Gasol e Mike Conley formam uma boa dupla, mas não estão no mesmo cacife de David Robinson (que já tinha sido MVP numa época em que a liga tinha Michael Jordan, Karl Malone, Hakeem Olajuwon, Patrick Ewing, Charles Barkley…). Também não há garantia nenhuma de que algum dos calouros vá ser alguém sequer próximo do que Tim Duncan se formou.

Mas a minha maior desconfiança hoje reside no fato que o Memphis está apostando em algo que não tem a tradição de fazer bem. Salvo algumas exceções, as escolhas dos Grizzlies são medonhas.

De 2010 pra cá, as escolhas que mais entraram em quadra, seja com a camisa azul do time ou com qualquer outra, foram Xavier Henry e Jarrell Martin, dois atletas que, na melhor das hipóteses, foram coadjuvantes esforçados. Apesar de servir de atenuante que nenhuma delas foi uma escolha muito alta, o time deixou passar algumas boas oportunidades que deixam claro que o draft não é uma especialidade da franquia. Ano retrasado escolheu o armador Wade Baldwin na frente de Malcom Brodgon e Dejounte Murray, outros jogadores da mesma posição que já mostraram mais talento na liga. Em 2014, selecionou Jordan Adams uma escolha antes de Rodney Hood.

A última vez que teve uma escolha alta, como a que deve ter no próximo draft, foi em 2009, quando teve a oportunidade de escolher o segundo melhor calouro daquela turma. E neste draft, que teve Blake Griffin, Stephen Curry, James Harden, Demar Derozan, Jrue Holiday e Ricky Rubio, a franquia escolheu o pivô Hasheem Thabeet – uma das piores decisões da história do draft da NBA.

Thabeet entrou em quadra 224 vezes ao longo da sua carreira na liga e teve médias de 2 pontos e 2 rebotes por jogo, mesmo com seus 2,21m de altura.

Por mais que seja bem mais justo cobrar a franquia pela falta de eficiência nos últimos drafts do que pela péssima escolha de quase dez anos atrás, fica clara a falta de vocação do Memphis em formar elenco pelo draft. E o time está se esforçando para ter uma das campanhas mais vexaminosas da história recente da liga por isso. O elenco atual, apesar de ter talento, tem suas limitações, seus melhores jogadores já estão na casa dos 30 anos e falta profundidade. O draft pode não ser a melhor estratégia. Todo esse vexame pode ser em vão.

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